segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Pero… hay gobierno?


Como a confissão alivia a alma, começo por uma declaração de interesses. Eu sinto-me sempre como o conhecido anarquista espanhol que foi empurrado para o exílio mexicano pelas tropas fascistas de Franco. Figura respeitada, foi logo cercado à chegada por um bando de jornalistas nativos que lhe pediram um comentário à disponibilidade do governo mexicano para o receber. Olhando-os com genuíno espanto exclamou de pronto: «Pero, hay gobierno? Soy contra!».
Tal como para ele, também para mim a questão não é ser este ou aquele a governar. Sou contra e pronto! Isto não significa que não existam governantes ou momentos de governação que estimulem particularmente esta minha aversão a quem manda e ao próprio acto de mandar. É assim que me sinto hoje, ao pensar nos atolambados que nos calharam em sorte. Este sentimento foi despoletado por uma notícia de rodapé que vi esta tarde num jornal gratuito: o nosso inefável primeiro-ministro garantiu que até ao final do primeiro trimestre de 2009 Portugal seria o único país do mundo em que todas as crianças dos primeiros anos de escolaridade terão um computador! Bem pode o mundo inteirinho roer-se de inveja. Verdade! Hão-de os nórdicos roer as unhas até ao sabugo com inveja do nosso querido Magalhães. Fiquem lá os noruegueses com o bacalhau, os suecos com os armários e os roupeiros e os finlandeses com os telemóveis, que a nós é que ninguém pára! O primeiro país do mundo! É obra! Claro que deve dar direito a entrar no livro dos recordes. Ao lado da maior feijoada e do empregado de mesa equilibrista! No mesmo jornal gratuito (leitura que vou alternando com A Bola) li também que a filha de Katie Holmes e Tom Cruise, uma tal de Suri, está no lote das crianças mais fotografadas do mundo. Talvez isso seja uma sorte ou um azar, pouco importa, mas vocês acham que a pequenita Suri tem um Magalhães?! Nem pó! Mas se tiver sorte, pode ser que o Zé Sócrates vá dar uma daquelas suas corridas de calção e guarda pretoriana pelas ruas de Hollywood e lhe leve a mais desejada das prendas: o computador Tintim.
Juro que quando falei de «pó» não estava a fazer nenhuma insinuação maldosa, mas lá que parece que alguma coisa anda a toldar o juízo desta tropa, lá isso parece. Então não bastava já aquela manifestação de pura piroseira pacóvia quando o nosso José decidiu presentear os líderes ibero-americanos com a maquineta? Bem fez o estouvado do Hugo Chavez que logo o arremessou (sabe deus a quem) para assim se assegurar da solidez do presente. Insinua-se que o presidente Lula sambou sobre ele com grande donaire e uma fonte geralmente bem informada garantiu-me que o nosso José está a negociar com uma escola de samba a adopção do Magalhães como tema para o próximo desfile de Carnaval.
E assim vamos, cantando e rindo, esperando, como sempre esperámos, a vinda de um Salvador que faça de nós o que queremos mas não conseguimos ser. A vez agora é do Magalhães. Símbolo da mais elevada tecnologia lusitana, é ele que nos vai redimir e salvar. Salvar de quê?! Não dos políticos que temos, que a tanto não chega o brinquedo azul. Mas redimir-nos-á do nosso atraso secular e da mansidão com que nos ensinaram a viver a vida e a aceitar as injustiças sociais. Redimir-nos-á pela certa. Afinal, mesmo que falte a sopa e o pão às inocentes criancinhas, o Magalhães as consolará!

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